Na manhã do dia 10 de setembro de 1964, Armando Rodrigues de Sá foi recebido em Colónia como uma estrela: era o imigrante um milhão. Em Colónia, à estação de Deutz, acabavam de chegar dois comboios com 1106 trabalhadores estrangeiros: 933 espanhóis e 173 portugueses. E ao contrário do que acontecia habitualmente, iam ter direito a um comité de boas-vindas.
Motivo: assinalar a chegada do milionésimo gastarbeiter – trabalhador convidado em alemão. (…) Assim que os passageiros desceram para o cais, intrigados com tanto aparato. Um intérprete começou então a percorrer as filas de trabalhadores e a gritar com sotaque germânico: “Armando Rodrigues! Armando Rodrigues!”Ao fundo da plataforma, Armando Rodrigues de Sá, 38 anos, não sabia o que fazer. “Ficou assustado. Achou que era a PIDE”, contou a viúva. Nervoso, tentou esconder-se. Por alguma razão que desconhecia poderiam querer prendê-lo. Ou enviá-lo de volta para Portugal, como tinha acontecido a 24 parceiros de viagem sem os papéis em ordem e que acabaram por ficar na fronteira.
Incentivado pelos companheiros de viagem, que gritaram “está aqui!, está aqui!”, o carpinteiro avançou. O intérprete explicou-lhe então que era o operário um milhão a chegar à Alemanha e que o governo tinha um prémio para ele”. Aos poucos, a tensão no seu rosto foi substituída por um sorriso largo, quando lhe deram para a mão – além de um ramo de flores e de um diploma a assinalar a ocasião – uma mota nova, da marca Zündapp. O ato foi transmitido pela televisão.
Naquela época, quem quisesse obter um passaporte válido para sair do País tinha de recorrer à Junta de Emigração e preencher uma série de requisitos: ter o serviço militar cumprido, apresentar uma certidão do registo criminal, documentar o grau de escolaridade, entregar uma certidão de nascimento, comprovar o estado civil e assinar uma declaração em que se responsabilizava pelo bem-estar da família. Criada em 1947, a Junta da Emigração cooperava com os países que angariavam operários em Portugal, com o objetivo de controlar as saídas.
Em 1961, a Embaixada Alemã em Lisboa queixava-se da demora dos processos de emigração. Por isso, a 17 de março de 1964, os governos de Portugal e da República Federal da Alemanha assinaram um acordo de destacamento de trabalhadores, ao abrigo do qual o Departamento Federal do Trabalho Germânico abriu escritórios em Lisboa e no Porto. Apesar de a Alemanha atravessar um período de grande crescimento económico, o recrutamento em Portugal continuou lento. Os Alemães pensavam que tal acontecia porque não conheciam a Alemanha. Por isso, decidiram fazer uma cerimónia para mostrar que eram bem recebidos.
Armando Rodrigues de Sá tornou-se um símbolo que representa a história da imigração. Hoje, aparece nos livros escolares da Alemanha, é frequentemente referido em documentários televisivos e há vários filmes que recuperaram as imagens da sua chegada a Colónia.
in Revista Sábado, n.º 513, fev./mar. 2014, pp. 76-79
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